terça-feira, 25 de junho de 2013

Nascem pássaros por dentro




Nascem pássaros por dentro
das árvores no meu quintal.
Tal qual como noutro tempo
de maneira original.

Em bercitos de ternura,
sem alta tecnologia.
com a mesma arquitectura
que não perdeu mais-valia.

Aproveitam materiais
ao abandono perdidos
que são os mais naturais
pela natureza oferecidos.

Acartam musgos e penas
e nunca levam as minhas.
Pudera, se vão crescendo
dentro de mim escondidinhas.

São assim simples e belas
como as rosas de um jardim,
vêem cantar-me à janela,
mesmo à beirinha de mim.

Oh, natureza eu te canto
porque nunca me traíste.
O que me ofereces é tanto
e tão pouco me pediste.



segunda-feira, 24 de junho de 2013

Nas noites cor de agosto




Vou pelos campos fora enluarados,
nas noites cor de agosto e vento ameno.
Escuto o tinir dos guizos nos cercados,
nas camas de luar feitas de feno.

As sombras não cativam os meus passos
marcados no caminho sobre o chão.
Ergo no deserto os meus dois braços.
Só o silêncio me abraça e dá a mão.

Pelo estio no palco das ramadas,
ensaia o rouxinol a partitura,
aberta nas serenas madrugadas
em estantes de beleza e de ternura.

E vou pela paisagem onde me prendem
os montes, os vales e os rios.
Quadros de encantos mil que se não vendem,
por entre penedos altos e bravios.



terça-feira, 11 de junho de 2013

Há um ano, há um dia, há uma hora




Há um ano, há um dia, há uma hora,
há uma eternidade, há um segundo.
Há uma dor indizível que não chora,
calada no teu peito mais profundo.

Há um querer de força não cativa,
liberta, até à hora derradeira.
Acaso pensa a morte que me priva
de andar contigo a par a vida inteira?




A casa paterna




A casa era modesta, mas airosa,

erguida à sombra de um pinhal
junto à beira-serra na encosta
com paredes em granito natural.

À porta uma videira moscatel

fazia sombra à entrada sempre franca.
Os armários, forrados a papel.
Na mesa aberta a toalha branca.

O sol entrava livre pela janela

e o luar quando vinha a lua-cheia.
À noite era a luz mortiça de uma vela
ou a luz do azeite puro da candeia.

No lajedo da cozinha, se era inverno,

ardia o fogo vivo de um braseiro.
Suspensa a panela de ferro com três pernas.
No chão, panelas de barro do oleiro.

Havia o orvalho da manhã

e o galo a cantar na capoeira.
Da horta vinha um cheiro a hortelã
e o murmúrio da água, da ribeira.

Havia o chiar dos carros manhã cedo,

puxados pelos castanhos e mouriscos,
e por entre a ramagem do arvoredo
acordavam os melros e os piscos.

Na adega havia os pipos da reserva,

onde o néctar ali jorrava a rodos.
Se na Aldeia o dia era de festa
pela porta franqueada entravam todos.